sexta-feira, 26 de julho de 2013

Ingredientes da Cerveja II - Levedura (Fermento) e Água



Seguindo nossa sequencia de posts sobre os ingredientes da cerveja, no último falamos sobre o Malte, e hoje falaremos sobre a Levedura e a Água:

Levedura Cervejeira (fermento):

A popular levedura, ou fermento, utilizado na produção de cerveja tem o nome científico de Saccharomyces Cerevisiae (para Ales) ou Saccharomyces Uvarum (para Lagers), e é um fungo unicelular. 

É a partir da fermentação do açúcar retirado do malte (ou outro carboidrato presente no mosto) que obtemos o álcool e o CO2 da cerveja (na verdade, obtêm-se mais de 3000 subprodutos na fermentação, mas esses são os principais e mais abundantes). Por isso há quem diga que o mestre cervejeiro não faz cerveja, e sim mosto, quem faz cerveja é a levedura. Não deixa de ser verdade, por isso o principal trabalho do Mestre Cervejeiro é disponibilizar um ambiente perfeito em temperatura e nutrientes para que a levedura trabalhe com perfeição, a qualidade da fermentação do mosto cervejeiro está diretamente ligada à qualidade final da cerveja. 


Levedura Cervejeira agindo em tanque aberto 
Fonte: jackzthebrewer.com


A Levedura também é responsável pela definição das 3 família de cerveja que abrigam os mais diversos estilos, são as Lagers (baixa fermentação), Ales (alta fermentação) e as Lambics (fermentação espontânea).  Existe uma série de mitos sobre as diferenças entre as famílias, o mais comum é o consumidor associar a cerveja Lager sendo clara e leve, enquanto a cerveja Ale é escura e encorpada. Não existe tal relação, e é até ilógica, a diferença básica é a forma como a fermentação acontece: Nas Lagers a levedura tende a flocular no fundo do mosto (Baixa fermentação / Bottom fermentation), enquanto nas Ales a levedura flocula na superfície do mosto (Alta fermentação / Top Fermentation). Já nas Lambics, não se adiciona a levedura, é deixado o tanque de mosto exposto às leveduras selvagens que estão no meio ambiente. Abaixo uma breve descrição de cada uma:

Ales

Seu nome origina dos antigos pubs/bares/tabernas britânicos, onde o termo beer nem existia, quem assiste a filmes medievais em inglês pode reparar no cavalheiro pedindo uma “Ale” quando chega ao bar. A fermentação das Ales ocorre em temperaturas mais elevadas que as Lagers, entre 17ºC e 25ºC, por isso, no perfil sensorial de uma Ale a levedura tende ter mais influência que nas lagers, expondo toques de frutas e especiarias (pimenta, cravo, etc) à cerveja.

Lagers:  

Em um primeiro momento da história cervejeira, a levedura era desconhecida, o cervejeiro preparava o mosto e esperava que, por ação divina, esse fermentasse. Como as cervejas eram produzidas a temperatura ambiente acima de 17ºC, as leveduras que ali agiam eram as que chamamos hoje de Ales e floculavam na superfície do mosto. Até que, durante o século XIX, na Baviera (hoje sul da Alemanha) foi proibida a fabricação de cerveja durante o verão para proteger a produção de cevada durante a entressafra, mas o cervejeiro poderia fabricar a cerveja no inverno e armazená-la até o verão.  Para armazenar em local protegido do calor, evitando que a cerveja estragasse, os mostos da cerveja eram colocados em cavernas nas montanhas geladas, e a levedura que encontraram ali era uma que agia a baixas temperaturas e floculavam no fundo do tanque, diferente das antigas. O nome vem exatamente desse “armazenamento” (E alemão, Lagerung).

Por fermentar em temperaturas mais baixas, entre 7ºC e 13º, as leveduras Lagers tendem a ter menos influência que as Ales o sabor final da cerveja, mas algumas cepas podem ser surpreendentes. Um caso muito conhecido é o da Heineken, uma lager com perfil sensorial extremamente frutado dado ao cuidado que eles tem com a levedura.

Lambic:  

Mesmo após o descobrimento das cepas de leveduras e as formas de inoculação, muitos produtores tradicionais seguem fazendo cerveja a moda antiga, deixando que leveduras selvagens ajam sobre o mosto cervejeiro. O nome origina da cidade de Lembeek, na região da Pajjotenland/Bélgica, que possui uma microflora biológica perfeita para esse tipo de cerveja (não tente fabricar uma Lambic em São Paulo). Como resultado, temos uma cerveja com perfil extremamente ácido, ideal para aperitivos.

As Lambics, muito comumente, levam adição de frutas durante a fermentação. As mais comuns são cereja (Kriek Lambic) e framboesa (Framboise Lambic).

Estilos de Cerveja com Levedura em destaque:


Alguns estilos tem levedura em destaque, o mais comum e mais popular no Brasil, sem dúvida, são as Weizens (Cervejas de Trigo Alemã), sejam elas Weissbier (clara) Dunkel Weizen (escura) ou Weizenbock (versão mais alcoólica, clara ou escura). A grande estrela dessas cervejas é a levedura, que trará aromas e sabores de banana e cravo tão evidentes que não é necessário ter um paladar apurado para perceber.


No entanto, os reis do trabalho com levedura são os Belgas. Nenhuma outra escola cervejeira dá tanta importância à ação das leveduras quanto a belga, gerando cervejas extremamente complexas e saborosas. É possível notar tons condimentados e frutados em praticamente qualquer estilo belga, sem contar nos sabores ácidos e terrosos das Lambics.

Então, não se esqueça, toda vez que tomar uma boa cerveja, agradeça ao trabalho incansável que esses micros seres chamados levedura fizeram por você.


Água para produção de Cerveja

Não vou me aprofundar muito nesse ingrediente, apesar dele compor (geralmente) mais de 90% da cerveja, não vale a pena tratar dela tecnicamente. Incluí esse ingrediente no mesmo post sobre levedura, pois a maior influência que a água pode ter no sabor da cerveja é na condição de meio ambiente da levedura.

Água é um dos ingredientes da Cerveja
Fonte: wallsave.com


Mas antes, vamos novamente debulhar o mito de que a fonte de água é essencial na produção de uma boa cerveja. Como dissemos no post sobre Mitos Cervejeiros, a tecnologia de hoje permite ao cervejeiro trabalhar a água de forma que ela fique exatamente como ele deseja. A única influência que uma boa fonte de água terá, será no barateamento do tratamento da água.

Mas por que tratar a água da cerveja?

Primeiro porque há alguns elementos da água que precisamos remover, pois resultará em sabores e aromas que não desejamos, é o exemplo do cloro que deve ser totalmente removido da água. Além de qualquer elemento impuro, claro.

Segundo, para criar o ambiente perfeito para o trabalho da levedura. A água em si não irá influenciar no perfil da cerveja, mas o trabalho da levedura vai. Por exemplo, os estilos de cerveja ingleses foram desenvolvidos com uma água muito dura, rica em Cálcio e Zinco, as leveduras adoram isso e tendem a trabalhar de forma mais eficaz, assim, consomem o açúcar em sua totalidade e o resultado é um perfil de malte discreto e uma textura de corpo mais seca.

Cada cepa de levedura tem um ambiente ideal de trabalho exclusivo, assim o cervejeiro irá trabalhar tanto o Ph como os sais presentes na água a fim de alcançar o trabalho perfeito das leveduras para o final planejado de sua cerveja.


Saúde

terça-feira, 23 de julho de 2013

Saiba ler um Rótulo de Cerveja



Como adiantamos no post sobre como comprar uma cerveja da semana passada, agora falaremos sobre outra importante ferramenta na hora de escolher uma cerveja para comprar ou para tomar, que é saber ler as informações no rótulo da cerveja.

Saiba ler um Rótulo de Cerveja

Informações Legalmente Obrigatórias no Rótulo de Cerveja:

Pela legislação Brasileira, há informações sobre a cerveja são obrigadas a constar no rótulo, e você pode usar algumas delas para orientá-lo sobre o liquido que está dentro da garrafa:

Ingredientes da cerveja:

Os ingredientes básicos da cerveja são: Água, Malte, Lúpulo e Levedura. As cervejas comerciais mais comuns costumam adicionar grandes quantidades de cereais não maltados (principalmente arroz e milho) para baratear a produção da cerveja. Por isso, muitas cervejarias que desejam ‘diferenciar seus produtos’ usam como Marketing a expressão ‘Puro Malte’, o que quer dizer que não há nenhuma outra forma de carboidrato usada na cerveja a não ser malte de cevada.

Mas há uma pegadinha aí: os passos para a fabricação de uma boa cerveja são muito mais amplos do que a opção pela origem do açúcar que irá fermentar (se é malte de cevada, arroz, milho, etc), e hoje é possível encontrar boas e más cervejas puro malte, assim como boas e más cervejas que não são. Então tenha para você que, se uma cerveja for puro malte, há uma boa chance de a cerveja ser de qualidade, mas não é certeza, no entanto, existem diversas cervejas (principalmente de estilos belgas) que contem alguma pequena porção de cereal não maltado e estão entre as melhores avaliadas do mundo.
Ainda em ingredientes, não dê muita bola se uma cerveja possui ou não conservantes, raramente eles influenciarão no sabor final da cerveja.

Graduação Alcoólica da cerveja:

A quantidade de álcool não representa, em si, como será a cerveja. No entanto, cervejas mais alcoólicas tendem a ter um caráter de sabor e aroma mais complexos, com corpo, dulçor e/ou amargor mais pronunciados. Isso porque esses elementos de sabor e aroma serão necessários para equilibrar a maior quantidade de álcool. Em uma cerveja de perfil leve e suave o alto teor alcoólico tenderia a ficar muito evidente e desagradável, e o cervejeiro teria que equilibrar essa composição.

Assim, quando encontrar cervejas com maior graduação alcoólica, há uma tendência que elas sejam mais elaboradas, com dulçor e/ou amargor pronunciado e um perfil mais complexo.

Cerveja Clara ou Escura:

A cor da cerveja é especificada na legislação pelas unidades de EBC (European Brewery Convention – Convenção Europeia Cervejeira). Qualquer cerveja com mais de 20 unidades de EBC é considerada uma cerveja escura. Isso ajuda em parte, pois 20 unidades de EBC é algo como acobreado, deixando vago ainda a real cor da cerveja. No entanto, quando observar no rótulo que a cerveja é clara, ela tende a trazer aromas e sabores provenientes do malte próximos ao pão ou biscoito. Já as cervejas escuras poderão trazer toffee ou caramelo até chocolate ou café, dependendo da intensidade da cor. 

Informações Adicionais no Rótulo da Cerveja:

Algumas cervejarias artesanais costumam colocar no rótulo diversas outras informações, não exigidas na lei, mas que ajudam o consumidor a identificar qual cerveja é aquela.

Estilo:

Por incrível que possa parecer, não é obrigatório à cervejaria dizer qual o estilo da cerveja no rótulo, mas a maioria o faz. Hoje há catalogados cerca de 120 estilos de cerveja, já falamos de alguns em outros posts do blog (como o Pilsen, alguns estilos de Cervejas de Inverno e alguns estilos no post sobre Malte) e falaremos de muitos outros mais adiante. Se você tiver preferência ou curiosidade por algum estilo, fica fácil encontrar a cerveja que irá lhe agradar.

Escala de Amargor:

O ingrediente responsável pelo amargor da cerveja é o lúpulo, mais precisamente, o Ácido Alfa presente no lúpulo. Quanto mais ácido alfa, mais amarga será a cerveja. Calculando a quantidade desse ácido presente na cerveja, chegamos à unidade de amargor em escala IBU (International Bitterness Unit – Unidade Internacional de Amargor).
Para ter uma referência, uma cerveja comercial chega a ter 5 IBUs, enquanto estilos mais amargos de cerveja, como Indian Pale Ale, tem a partir de 40 IBUs (podendo chegar a mais de 100). Assim, quando essa informação estiver presente no rótulo, tenha a referencia de que 5 IBUs é um amargor baixo e a partir de 40 é alto, assim pode ter uma ideia do nível de amargor da sua cerveja.

Escala de Cor:

Já dissemos que é obrigatório constar no rótulo se a cerveja é clara ou escura, mas com uma vaga percepção de cor real. Algumas cervejarias colocam em seus rótulos a real escala de cor, que pode ser em EBC (citado acima) ou SRM (Standard Reference Method), que são duas escalas sutilmente diferentes. Abaixo é possível ter uma referência de cor de cada escala. Falamos sobre a relação entre cor e sabor no post sobre Maltes.

Escala de cores da Cerveja


Análise Sensorial.

É crescente o número de cervejarias artesanais que descrevem uma analise sensorial da sua cerveja no rótulo, dizendo o que o consumidor irá encontrar naquela cerveja e, com frequência, recomendando harmonizações. Aconselho aos iniciantes darem preferência às marcas que fazem isso,  ao mesmo tempo que terá uma ajuda importante na informação, estará fomentando a aplicação dessa descrição nas cervejarias que não o fazem.

Concluindo

Sabendo ler um rótulo de cerveja, a chance de você se decepcionar com a cerveja que comprou diminui bastante, somando essas dicas ao do post sobre como escolher cervejas, você terá um caminho mais fácil para selecionar as cervejas que gosta e aprimorar seu paladar a cada dia. Não esquecendo uma frase que também estará presente nos rótulos da sua cerveja:



Beba com moderação!!!

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Como escolher qual cerveja comprar


Semanalmente, às vezes mais de uma vez por semana, vou ao supermercado para comprar cerveja. Hoje em dia, as grandes redes (como Pão de Açúcar, Zafari, Mambo e outras) contam com uma grande variedade de cervejas e, geralmente, com preços mais competitivos que lojas online ou empórios.

O problema é que raramente se encontra alguém especializado para orientar o consumidor nesses locais. Não é raro observar clientes curiosos admirando as cervejas além das ‘American Lagers’ (as famigeradas Tipo Pilsen) que estamos acostumados: Olham, olham... Pegam uma garrafa, olham o contra rótulo... Devolvem... Pensam, pensam, pensam... Desistem e recorrem àquela antiga e conhecida marca comercial.

Como escolher qual cerveja comprar na g^ndola do supermercado?


É compreensível que exista uma resistência em sair do usual, afinal, as cervejas que esse público está acostumado a consumir custa (pelo menos) metade do preço das cervejas artesanais e/ou importadas, que invadiram as gôndolas dos supermercados. Além de receoso quanto ao preço, são tantas variedades que o consumidor fica perdido e não sabe onde investir o seu dinheiro. E isso tudo pode realmente ser um problema para alguns potenciais clientes, mas não para quem lê as dicas do Bê-á-bá da Cerveja que listamos abaixo...


Por que pagar mais caro por uma cerveja no supermercado?

Essa é fácil, e já respondemos aqui.

No princípio, não invista muito dinheiro achando que uma cerveja é melhor por ser mais cara.

Nem tudo que é melhor é mais caro. É possível encontrar diversas cervejas, premiadas inclusive, na faixa de R$5,00 (long neck) ou R$10,00 (600ml), alguns exemplos comuns são Baden-Baden, Bamberg, Colorado ou Eisenbahn; mas há outros.

Além disso, se você não está acostumado a tomar “cervejas especiais”, pode se decepcionar com uma cerveja que terá potencial para lhe agradar no futuro. Certa ocasião para celebrar, quando eu estava começando os passos em provar diferentes tipos de cerveja, comprei duas garrafas que custavam em média R$70. Abri com grande expectativa, eram razoavelmente boas, mas não achei que o custo-benefício compensara, pois meu paladar não estava preparado para toda complexidade que aquelas cervejas ofereciam. Hoje em dia, ambas as cerveja estão entre as minhas favoritas.

Assim, procure comprar boas cervejas a preços mais razoáveis para, à medida que se sentir confortável, provar as mais caras.


Prove vários estilos de cerveja, de várias marcas.

Faz um tempo, apresentei uma cerveja a um amigo meu, ele adorou... E desde então só compra essa mesma marca de cerveja, por mais que eu tente convencê-lo a provar outras, ele “não quer arriscar”. Mas há um mundo muito maior a ser explorado.

No começo, dê preferência para os estilos mais próximos da American Lager que você está acostumado a consumir. Cervejas claras e, de forma geral, leves. Weissbier, Pilsen, Helles, Witbier e Kolsh são alguns exemplos de estilos facilmente encontrados, inclusive são fabricados por diversas cervejarias nacionais.

O próximo passo é provar outros estilos de cerveja, com outras cores, outros sabores, outros amargores, etc. “Mas qual tipo?” Isso é tão pessoal que minha resposta para você é: prove todos os possíveis, alguns preferem um estilo específico, outros preferem outros...


Não desista, NUNCA.

Comprou uma cerveja e não gostou? Não desista... Nem da procura por uma cerveja que o agrade, e nem da cerveja que hoje não gostou. Duvido que alguém tenha gostado de cerveja (seja ela qual for) na primeira vez que provou. O mesmo vale para vinho, café, e diversas outras bebidas. Se você não desistiu antes, por que desistirá agora?

Sem dúvida existem diversos estilos de cerveja que o agradarão, elas estão aí, não desista de lutar por elas (momento William Wallace). Além disso, nosso paladar a adaptável; é possível que haja rejeição por uma bebida mais amarga ou mais alcoólica em um primeiro contato, mas uma evolução progressiva pode te levar a grandes revelações no futuro. Eu mesmo tinha rejeição por amargor no princípio, mas hoje, muitas das minhas cervejas prediletas são extremamente (e é EXTREMAMENTE mesmo) amargas.


Deseja harmonizar sua cerveja com algum prato em especial?

Se seu objetivo é comprar uma cerveja para harmonizar com aquele jantar especial, não vá cego às compras, o risco é grande. Cerveja vai muito bem com comida, e há uma literatura muito vasta a respeito disso na internet, com cada prato haverá um estilo perfeito. Aqui mesmo no blog já demos algumas dicas para harmonizar cervejas de inverno, e daremos muitas outras pontualmente.

Então minha dica é: Pergunte ao Oráculo (vulgo Google) qual estilo de cerveja combinará com a sua refeição antes de comprá-lo!


Saiba ler um rótulo de cerveja

Saber ler um rótulo de cerveja pode lhe ajudar bastante na hora da compra... Mas como nem tudo na vida é perfeito, você terá que esperar o próximo post, que será exatamente sobre esse assunto...


BOAS COMPRAS!!!

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Ingredientes I - Malte de Cevada



Caros leitores, no caminho de desmistificar o mundo da cerveja, iniciaremos uma série para tratar dos ingredientes básicos da cerveja. As postagens serão intercaladas com outros temas e tratarão da água, do lúpulo, da levedura e (na postagem de hoje) do Malte.

Muita gente acha que ‘malte’ e ‘cevada’ são sinônimos, mas não é bem assim. O que chamamos de malte é o grão (que pode ser de cevada, trigo, milho, aveia, ou outro) que passa pelo processo de malteação. Como estamos falando de cerveja, vamos tratar aqui do malte de cevada. 
A cevada é germinada e seca para se transformar em malte

Mas por que transformar a cevada em malte de cevada?

O grão de cevada cru é rico em proteínas e amido, já quando malteada, a cevada é libera enzimas e açucares presentes nos grãos que são essenciais para a produção de cerveja.

O primeiro passo para a malteação é a maceração, que trata de umidificar o grão para que esse tenha condições de germinar. Iniciada a germinação, o grão passa por mutações, incluindo uma cadeia menor de amido (mais facilmente quebradas) e a liberação de enzimas, que serão responsáveis por quebrar a cadeia de amido não fermentável em açúcar fermentável.

Após atingir o ponto enzimático ideal, a germinação é interrompida por meio da secagem do malte. O malte germinando tem cerca de 45% de umidade, é levado à secagem em temperaturas que variam de 20°C a 100°C (dependendo da coloração final do malte). Após seco, o malte deve possuir uma umidade de 4% a 5%. Esse processo visa manter as propriedades enzimáticas do malte resguardadas e o malte próprio para estocagem.

Durante a secagem, ou após a mesma, pode ocorrer a torrefação dos grãos para a produção de cervejas mais escuras. No processo de torrefação, a reação entre os aminoácidos e as proteínas do malte formam meloidinas de coloração escura, esse processo é conhecido como Reação de Maillard. É importante salientar que quanto mais torrado o malte, menor será seu poder enzimático. Assim, a base da produção da cerveja geralmente será com maltes claros, e os maltes tostados serão adicionados com finalidade no sabor, aroma e coloração.

Bacana, já sabemos o que é malte, mas qual o seu papel na cerveja?

Bem, primeiramente, como citamos, o malte irá proporcionar à cereja o açúcar fermentável que será transformado em álcool. Mas ele tem diversos outros papeis sensoriais na cerveja: ele é partícipe essencial para determinar o sabor, o aroma, a cor, o corpo e a textura da cerveja.

A torrefação (ou não torrefação) do malte irá proporcionar uma escala gradual de coloração, sabores e aromas à cerveja. Maltes mais claros irão propiciar uma cerveja clara e trarão sabor de massa fresca e/ou pão. Á medida que utilizasse maltes mais escuros, a cerveja passa a apresentar pigmentação proporcionalmente escura, saindo do dourado e passando pelo cobre, âmbar, marrom, podendo chegar ao preto profundo.

Escala de cores da cerveja

Os aromas e sabores tendem a acompanhar a coloração e incorporar, gradativamente, sensações de biscoito, toffee, caramelo, chocolate, café e outros. Esses sabores são característicos do processo de Maillard, citado acima. Esse é o mesmo processo pelo qual carnes e massas passam ao ser expostos ao aquecimento (pão assado, carne assada, etc), isso lhes confere coloração e sabores semelhantes aos do mate tostados, e uma rica relação entre cervejas maltadas e carnes assadas, que comentamos no post sobre cervejas para o inverno.

O malte também será responsável pelo corpo, teor alcoólico e textura da cerveja. Já vimos que o malte irá fornecer à cerveja o açúcar que será fermentado e transformado em álcool, quanto mais açúcar for fermentado, mais alcoólica será a cerveja, no entanto, nem sempre desejamos fermentar todo o açúcar presente na cerveja, muitas vezes desejamos manter um residual de açúcar que irá intensificar o dulçor, sabor e aroma do malte, conferindo um corpo mais denso e uma textura mais aveludada. Por outro lado, se a levedura consumir o álcool por completo, ou quase por completo, teremos uma cerveja com corpo mais leve e textura mais seca (nos aprofundaremos mais quando falarmos sobre a levedura).

Abaixo, seguem alguns estilos de cerveja, e suas origens, que terão o malte como destaque no conjunto:


Cervejas Claras: Helles (alemã), Maibock (alemã), Kolsh (alemã), Pale Ale (Inglesa), Blond Ale (Belga), Golden Strong Ale (Belga), Tripel (Belga).

Cervejas Ambar: Vienna Lager (austríaca), Bock (alemã), Altbier (alemã), Red Ale (irandesa).

Escuras: Doppelbock (alemã), Brown Ale (inglesa), Barley Wine (inglesa), Scotch Ale (escocesa), Brune Ale (belga), Dubbel (belga), Quadruppel (belga), Dark Strong Ale (belga).

Muito Escuras: Schwarzbier (alemã), Dark Lager (alemã), Porter (inglesa), Stout (inglesa/irlandesa), Imperial Russian Stout (inglesa/americana).

Lembrando que esse guia acima é geral e não é absoluto, é possível (por Exemplo) encontrar uma Bock que seja escura, ou uma Barley Wine que seja âmbar. Mas é interessante notar que as notas de malte devem acompanhar a intensidade da cor, as mais claras devem trazer notas de pão e massa fresca. As âmbares poderão trazer sutis notas de toffee podendo chegar a caramelo. As escuras deverão ter o caramelo acentuado, talvez chocolate, trazendo um princípio de tostado que pode lembrar café. As muito escuras deverão trazer notas tostadas nítidas, geralmente acompanhadas de chocolate noir e café.

Malte defumado, já provou?

Antigamente, a secagem do malte era feita a lenha. Era difícil de controlar e todas as cervejas ficavam escuras e com sabor de fumaça. Com o advento do carvão, mais controlável, na secagem e torrefação, o cervejeiro poderia definir a coloração de seu malte e não havia resíduos de fumaça neles.

No entanto, um estilo alemão de cerveja continua até os dias de hoje sendo produzida com maltes defumados, as Rauchbiers. Esses maltes dão um tom defumado facilmente perceptível a cerveja, lembrando bacon ou embutidos defumados. As Rauchbiers são ótimas com churrascos ou feijoada e uma experiência incrível àqueles que nunca provaram.

Existe uma lenda de que ela haveria sido criada após um incêndio em uma casa que “defumou” os maltes do cervejeiro. No entanto, essa história carece de fontes (ao menos para mim) fidedignas. Ainda, como os maltes mais antigos já eram defumados, isso é, já havia uma experiência humana prévia nesse sentido, custo a acreditar que essa história do incêndio seja verdadeira.
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