quinta-feira, 28 de agosto de 2014

A Verdadeira História da Cerveja IPA



Se você for um entusiasta de cervejas já há algum tempo, certamente já ouviu a famosa versão de como foi criado um dos estilos mais consagrados dentro do movimento cervejeiro, a India Pale Ale, cerveja que tem nas suas características mais marcantes o amargor destacado.

Brooklyn East India Pale Ale
Brooklyn East India Pale Ale
Fonte: http://www.theperfectlyhappyman.com
  A versão da história a que me refiro vem sido passada de boca em boca e consta até em ótimas literaturas cervejeiras como “A Mesa do Mestre Cervejeiro – Garrett Oliver”, inclusive já foi até postada aqui mesmo no blog anteriormente quando falamos sobre o lúpulo, e transcrevo aqui resumidamente:


No final do século XVIII e começo do Século XIX a colonização Britânica na Índia já estava bem estabelecida e os colonos precisavam de cerveja. No entanto, pelo Canal da Mancha as mesmas não resistiam às longas e calorentas viagens, azedando. Além disso, devido ao calor na Índia, era impossível fabricar cerveja ali.

A solução foi dada pelo Inglês George Hodgson: Ele produziu uma Pale Ale com mais álcool e lúpulo, notórios conservantes naturais, deixando fermentar por muitos meses até que se esgotassem todas as reservas de açúcar, dificultando com que qualquer micro-organismo sobrevivesse na cerveja, além disso, a cada barril de cerveja pronta adicionou-se uma dose extra de lúpulo como conservante. O resultado foi uma cerveja com cerca de 7% de álcool, extremamente seca e amarga. A viagem à Índia foi completada com sucesso pelo Canal da Mancha.


Mas a história não é bem assim

 Recentemente, duas leituras me chamaram bastante atenção e refutam a romântica história citada acima. Calma, amigo cervejeiro, não estou enlouquecendo... As leituras a que me refiro são dos livros “IPA – Brewing Techniques, Recepies and the Evolution of India Pale Ale – Mitch Steele” (IPA – Técnicas de Brassagem, Receitas e a Evolução da India Pale Ale – Mitch Steele) e “The Oxford Companion to Beer – Garret Oliver” esse segundo, em um artigo assinado por Pete Brown. Em ambos, mostram embasadas pesquisas históricas com datas e registros da época.

A bem da verdade, realmente George Hodgson foi um grande exportador de cervejas às Índias, mas essa história começa com a fundação de uma instituição chamada British East India Company (BEIC, que tinha o intuito de estabelecer o comercio entre Londres e as índias. Pouco tempo depois, uma cervejaria estabeleceu-se nas proximidades da BEIC, em Londres, a Hodgson’s. Isso permitiu criar um grande acordo comercial entre as partes e a cervejaria tinha praticamente um monopólio das exportações de cerveja que já eram feitas em navio.

No entanto, a Cervejaria Hodgson’s era reconhecida pela produção de Porters, embora também fabricasse Pale Ale e uma Ale forte conhecida como October Beer. A grande questão é que, documentos da época, mostram que Hodgson’s exportava não apenas a Pale Ale, mas também seus outros estilos do portfólio, e todos chegavam às índias em boas condições.

A literatura da época também mostra que maturar as cervejas dedicadas à exportação por longo período (praticamente um ano), para que os barris não explodissem nas viagens, e adicionar lúpulo extra para conservação, eram conhecimentos comuns da época e não foram desenvolvidos pela Hodgson’s. Além do mais, George Hodgson nunca clamou ter desenvolvido uma receita especial para enviar a Índia, o que demonstra que se tratavam das mesmas cervejas que ele distribuía na Inglaterra.

Alguns anos mais tarde, quando a cervejaria passou a ser controlada por Frederick Hodgson (neto de George) começaram a surgir rusgas com os dirigentes da BEIC, e esses procuraram uma cervejaria de Burton-on-trent, a Allsopp, e pediram que a mesma replicasse a receita de Pale Ale fabricada por Hodgson. Acontece que a água de Burton-on-trent é rica em sulfatos, o que proporcionou uma cerveja mais clara e refrescante, ideal para o clima da índia. Em seguida, outras cervejarias também começaram a exportação de cervejas semelhantes, com destaque para a cervejaria Bass, que em pouco tempo superou a exportação da Allsopp.

Durante muitos anos, essa Pale Ale dedicada à Índia (daí surgem os primeiros registros de India Pale Ale) era a principal bebida dos colonos ingleses que lá estavam. Ainda que se exportassem Porters em grandes quantidades, era difícil que com temperaturas médias acima dos 30ºC algo fosse mais palatável que as Pale Ales. No entanto, no final do século XIX o desenvolvimento da refrigeração artificial permitiu o fabrico de cervejas na índia e, com a popularização das Lagers (mais leves e refrescantes) em todo o mundo, gerou um declínio gigantesco na produção de India Pale Ales.

Pint de IPA
Fonte: http://beer.about.com
Poucas IPAs seguiram em produção após a revolução das lagers, e tinha o comercio completamente focado na Grã-Bretanha, um dos poucos países a manterem as tradicionais Ales. Foi apenas recentemente, com a explosão da Beer Revolution nos anos 80 e 90, encabeçada por cervejeiros artesanais e caseiros que o estilo foi resgatado e massivamente produzido como conhecemos hoje.

Concluindo...

A história dessa cerveja que tanto amamos pode não ser tão simples e romântica como pensávamos, mas é sem dúvida mais cativante e complexa, talvez até mais apropriada a essa tão rica cerveja, marcada pelo amargor do lúpulo em destaque, corpo médio e álcool ao redor dos 7%, que fazem do estilo o predileto de 9 em cada 10 apreciadores da verdadeira cerveja.

Cheers.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Escola Cervejeira I - Alemã



No nosso último post, falamos sobre a história da cerveja de uma ótica global, agora aprofundaremos em cada uma das escolas cervejeiras, suas características e como surgiram seus estilos.

Chamamos de Escolas Cervejeiras as regiões e populações onde, no decorrer da história, foram desenvolvidos os estilos de cerveja que hoje conhecemos e são reproduzidos pelo mundo. De forma geral, cada escola cervejeira possui características que confundem com a história particular de sua sociedade, além das características regionais de produção.

As Escolas Cervejeiras, a saber, são: Escola Alemã (Incluí Alemanha, Rep. Tcheca e Áustria), Escola Belga (Inclui Bélgica e França), Escola Britânica (Incluí Inglaterra, Irlanda e Escócia) e Escola Americana (Estados Unidos da América). Nesse artigo, trataremos da Escola Alemã.

Cerveja Alemã Oktoberfest
A Tradicional Oktoberfest. Fonte: http://9dades.com.br

O nascimento da Escola Alemã.

Na região da Baviera, hoje sul da Alemanha, houve cerveja desde sempre. Como citado no post anterior sobre a história da cerveja, até a idade média, fabricar cerveja era uma atividade que cabia às mulheres em suas casas. Os primeiros registros de cerveja em escala industrial apontam para os mosteiros por toda a Europa, e na Alemenha não foi diferente, tanto que a cervejaria mais antiga do mundo em atividade até hoje data de 1.040 e nasceu na extinta Abadia de Weihenstephan, hoje uma Universidade.

A Lei da Pureza da Cerveja Alemã

Mas a história das cervejas alemãs, tal qual conhecemos hoje, começa em 1.516 (primórdios da Idade Moderna) com a promulgação da famigerada Lei da Pureza (Reinheitsgebot, para os íntimos). A Lei foi introduzida pelo Duque Guilherme IV (Wilhelm IV, para os íntimos) da Baviera, e restringia-se apenas a essa região. Poderia escrever um post exclusivo sobre essa Lei, de tão vasto e interessante o assunto, mas não faz sentido falar da Escola Alemã sem citá-la.

A Lei da Pureza Alemã pregava, entre outras coisas, que os únicos ingredientes permitidos na produção da cerveja seriam água, cevada e o lúpulo (a levedura ainda era um elemento desconhecido, e foi inserida na lei posteriormente). A Lei também decorria sobre os impostos cobrados sobre a produção da cerveja, assim como os valores pela qual a mesma deveria ser comercializada.

A Reinheitsgebot vingou por mais de 400 anos, foi sofrendo adaptações (a principal foi a inclusão do trigo como ingrediente) e estendida a todo território Alemão, mas a essência seguiu a mesma. No século XX, o povo alemão teve de abrir mão da Lei da Pureza tal qual ela era, principalmente por questões alfandegárias dentro da Comunidade Europeia. Em 1993 a Lei da Pureza Alemã foi alterada para Lei Provisória da Cerveja Alemã (Vorläufiges Deutsches Biergesetz, para os íntimos), que é mais flexível e permite a inclusão de adjuntos e aditivos para cervejas destinadas a exportação e cervejas de alta fermentação. No entanto, o povo Alemão e os produtores da bebida continuam fieis a antiga tradição de Pureza.

Até aqui, essa história toda não é novidade para um monte de gente, mas vamos apimentar um pouco o assunto... Diversas cervejarias, inclusive as brasileiras, expõe com destaque em seus rótulos e campanhas publicitárias o orgulho de seguir a Lei da Pureza Alemã, como se isso fosse sinônimo de qualidade. Não é, e nem nunca foi.

Dentro de um contexto histórico, a criação da Reinheitsgebot se deu por questões políticas, econômicas e salutares acima da qualidade em si. A primeira razão era inserir imposto sobre a criação e distribuição da bebida. Mas os principais motivos recaem sobre os ingredientes:

Naquela época, a cerveja considerada mais nobre era feita com trigo, e não cevada, no entanto a cevada era muito ruim para a fabricação de pães. Com o trigo sendo usado na fabricação de cervejas, o preço do mesmo era inflacionado e gerava consequente alta no valor dos pães. Assim, determinou-se que a cerveja deveria ser feita exclusivamente com cevada, o trigo deveria ser reservado à fabricação de pães e a aveia à ração para animais. Mas nosso amigo Duque da Baviera de bobo não tinha nada, além dele mesmo deter a maior parte da produção de cevada, a cerveja de trigo, por ser considerada nobre, ainda podia ser fabricada por cervejarias com autorização especial, ou seja, as que serviam a aristocracia.

Já o lúpulo, como comentamos em outros posts, foi adicionado à cerveja devido às suas propriedades bactericidas, que ajudava preservar a mesma. Nessa época o lúpulo já era bastante difundido pela Baviera, mas nem sempre era usado, sendo algumas vezes preterido pelo gruit (infusão de ervas). O problema de usar o Gruit eram dois: primeiro a cerveja poderia estragar logo e, segundo, sem controlar os elementos dentro da cerveja alguns cervejeiros por vez adicionavam substancias que não faziam bem a saúde. Tendo essas questões em vista, determina-se que apenas o lúpulo poderia ser usado.

As Lagers Alemãs

Como a levedura ainda era desconhecida, os cervejeiros apenas sabiam que a espuma formada durante a fermentação que flutuava sobre a cerveja poderia ser escumada para outro tanque a fim de iniciar nova fermentação. Mas ainda acreditavam que esse era um processo divino. Essa levedura era geralmente do tipo Ale e fermentava a temperaturas acima de 17ºC.

Foi em 1553 que essa história começou a mudar, e meio que por acaso. O Duque Albrecht V da Baviera estava preocupado com a qualidade das cervejas produzidas no verão e que tendiam a estragar rapidamente, assim, promulgou uma lei que limitava a produção de cerveja aos meses frios e deveriam ser armazenadas se quisessem servir cervejas no verão. Obviamente que a produção das nobres cervejas de trigo para a aristocracia estava liberada.

Pois então as cervejas passaram a ser armazenadas às encostas dos Alpes ou em enormes adegas subterrâneas para que as baixas temperaturas pudessem preservar o liquido até o verão. A grande surpresa é que a “espuma divida” (nossa ainda desconhecida levedura) agia de forma diferente no frio, ao invés de flutuar sobre o mosto da cerveja, ela decantava no fundo da mesma e trazia outros benefícios: Primeiro que as bactérias dificilmente sobreviviam a baixas temperaturas, diminuindo assim as chances de contaminação da cerveja. Além disso, o perfil sensorial das leveduras que fermentam a frio tende a ser mais discretos que nas fermentações mornas. Tudo isso permitia que o cervejeiro mantivesse os padrões das levas sem surpresas.

Outra característica era o tempo de fermentação mais longo do que as cervejas que fermentavam a temperaturas mais altas. Isso exigia que as cervejas ficassem longos tempos armazenados em adegas, e é desse “armazenamento” (Lagerung, em alemão) que surgiu o termo Lager para as cervejas de baixa fermentação.

A Lei caiu em 1850, mas aí já estava estabelecida uma nova forma de fazer cerveja na Baviera.

As Cervejas Ales Alemãs.

Os alemães são, sem dúvida, famosos por suas Lagers, mas algumas Ales merecem destaque nesse cenário: A começar pelas Weizen’s (Cervejas de trigo) que eram consideradas nobres e podiam ser fabricadas pelos aristocratas, são comumente encontradas e reproduzidas no Brasil, além da porta de entrada para muitas pessoas no mundo mais amplo da cerveja.

Outras duas cervejas Ales alemãs de muito destaque são originários da Colônia e de Dusseldorf, respectivamente Kölsch e Altbier. Ambas cidades preferiram manter suas tradições quando surgiu a febre pelas cervejas de Levedura Lager, em especial a Pilsen. Mas as semelhanças param por aí, as cidades nutrem uma enorme rivalidade histórica (desde que Dusseldorf fazia parte da Colônia) como podem ver na imagem abaixo.
Cervejas Ales Alemãs
Fonte: http://cervejariabamberg.blogspot.com.br
As cervejas também possuem perfis sensoriais totalmente opostos, mas trataremos deles e de diversos outros estilos Alemães em um próximo post, com analise sensorial e dicas de harmonização.

Ein Prosit!!!

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

A História da Cerveja



Você que acompanha o nosso blog já sabe o que é Malte, o que é Lúpulo e o que é Levedura. Além disso, já recebeu diversas dicas, por exemplo, como comprar cerveja ou como escolher uma cerveja para o inverno ou para acompanhar um doce. Agora iniciaremos mais uma série de posts que irão, digamos, romantizar um pouco nossa bebida predileta, e deixar o leitor imbatível em qualquer resenha de bar. Falaremos sobre as histórias, as origens e outras curiosidades sobre como surgiu a cerveja, como ela se desenvolveu e como ela chega a nossa mesa (não estou falando do garçom).

O primeiro texto irá tratar da história da cerveja de forma macro, como ela evoluiu dentro de um cenário mundial. Nos próximos, falaremos do surgimento e desenvolvimento de cada uma das escolas cervejeiras conhecidas.

Surgimento da Cerveja

Os primeiros indícios do surgimento da cerveja datam de 8.000a.C. (isso mesmo, não é erro de digitação) na antiga Mesopotâmia. Há registros de que o homem deixou de ser nômade para se tornar sedentário quando desenvolveu técnicas de agricultura, e um dos principais cereais cultivados por eles era a Cevada, apesar de que, visto do ponto de vista arqueológico, qualquer bebida fermentada de grãos pode ser considerada cerveja (assim como qualquer bebida fermentada de frutas é considerada vinho).

Consumo de cerveja na história da Babilônia
Babilônia: 6.000a.C.

Enfim, é provável que a bebida tenha sido descoberta por acaso, pois, como já vimos, o processo de transformar cevada em malte de cevada não é tão simples assim. Provavelmente um lote de grãos esquecido dentro de um vaso umedeceu, germinou, secou e tornou a umedecer. Essa bebida fermentou e alguém teve a (brilhante) ideia de prova-la, e não é que gostou?!?

No passar dos anos, assim como a sociedade se desenvolvia na Mesopotâmia, desenvolveu-se também a habilidade em produzir cervejas, assim como sua importância na sociedade. O primeiro registro de uma receita na humanidade é exatamente sobre cerveja, cerca de 4.000a.C.. O primeiro conjunto de leis organizadas com registro, o Código Hamurabi (1.770a.C.), conhecido como “Olho-por-olho, Dente-por-dente”, citava a cerveja em diversos artigos, inclusive: o taberneiro que fosse flagrado cobrando demais pela cerveja, seria punido com morte por afogamento na própria bebida.

No Egito, também há registro de bebidas fermentadas de grãos que datam de 5.000a.C., e se você estava achando que os Babilônicos e os Sumérios da Mesopotâmia levavam cerveja a sério, prepare-se: No Egito Antigo, a cerveja era considerada alimento básico, inclusive para crianças, e usada como pagamento por trabalhos. A Cerveja foi usada como forma de pagar os trabalhadores das pirâmides, sendo servida 3 vezes ao dia. Já em 1.250a.C. o faraó Ramsés II possuía diversas cervejarias, capazes de produzir 5 milhões de litros por ano utilizando até 40% de todo cereal do Egito. Ramsés II utilizou as riquezas adquiridas a partir da cerveja para financiar guerras e construir cidades. Diversos registros também confirmam que a cerveja era usada como medicamento contra praticamente qualquer mal naquela época.

Aposto que a essa altura do texto você já olhará diferente para a sua cerveja antes de consumi-la. Mas vamos seguindo... Obviamente, as comunidades foram se expandindo além da região do Norte da África e Oriente Médio para a Europa. Durante o período da Grécia Antiga e do Império Romano deu-se muito mais atenção à produção de vinho, considerado bebida mais nobre, ficando a cerveja em segundo plano e oferecida às classes mais baixas.

Cerveja na Idade Média

Foi durante o período da idade média que a Europa definitivamente se dividiu entre países produtores de cerveja e países produtores de vinho. Além de uma questão cultural, era uma questão de geografia. Enquanto a região ao sul da Europa (Itália, França, Espanha e Portugal) havia sofrido mais influência do império romano e tinha todo o Terroir propício ao cultivo da uva, a região ao norte (Alemanha, Áustria, Rep Tcheca, Bélgica e Grã Bretanha) desfrutava de uma vasta produção de grãos. 


Em um grande período da história a produção de cerveja era basicamente caseira, e a responsabilidade em produzi-las recaia sobe às mulheres. O mais provável é que a produção de cervejas em escala industrial tenha se iniciado nos mosteiros. Já era comum aos monges produzirem cerveja para consumo próprio durante os períodos de jejum, em que passavam semanas sem poder ingerir alimentos sólidos (bobinhos eles, não?!?) e perceberam aí uma boa oportunidade de expandir os negócios. Essa tradição de fabricar cerveja em mosteiros perpetua até hoje em toda Europa, com destaque aos famosos mosteiros Trapistas.

A cerveja da idade média já era, obviamente, bastante diferente da cerveja na mesopotâmia. Os grãos já eram malteados e, no lugar do lúpulo, usava-se uma infusão de ervas chamada gruit. Apenas a levedura ainda era desconhecida, achavam que a bebida fermentava por obra divina.  

O método de produção também era semelhante ao de hoje, cozinhando e fervendo o mosto antes de fermentar. O curioso é que eles desconheciam que, ao ferver, estavam automaticamente sanitizando a bebida, o que tornava a cerveja uma bebida mais segura para ingerir que a água: eles percebiam que pessoas que tomavam água frequentemente adoeciam, já que os córregos eram usados até como esgotos, já quem tomava cerveja permanecia saudável, assim a cerveja fazia parte da alimentação básica de adultos e crianças nesse período. Pra se ter uma ideia, durante a idade média o consumo per capto de cerveja variava de 400 a 1000 Litros por ano, hoje o país que mais consome cerveja de forma per capta é a Rep. Tcheca com 168L/ano, no Brasil consumimos 56L/ano.


Cerveja e a Idade Moderna

O primeiro registro de lúpulo adicionado à cerveja foi feito pela monja beneditina Hildegard Von Bingen, no princípio da Idade Média, mas se popularizou durante a Idade Moderna. Hildegard era uma conceituada botânica e incluiu a planta na cerveja por suas propriedades bactericidas, nem ela imaginava que hoje teria tantos fãs da plantinha amarga. Já em 1516 a famosa Lei da Pureza Bávara (nos aprofundaremos mais nela em uma próxima ocasião) já preconizava que as cervejas produzidas ali não poderiam conter nada além de água, malte, e lúpulo.

A cerveja tinha grande importância durante toda a idade moderna, mas não me alongarei muito aqui, pois a formação de cada escola cervejeira passa principalmente por essa época e trataremos cada uma de forma específica posteriormente.

A Cerveja de.... Hoje.

 Em 1680.....

Uma pausa: Até esse ponto, tratamos de quase 10.000 anos de história da cerveja, e ela evoluiu, mas a passos lentos. Esse é o momento da história que realmente mudou o cenário cervejeiro e proporcionou um desenvolvimento acelerado até as cervejas que conhecemos hoje. Voltemos ao texto.

Em 1680 inventou-se o microscópio, e com ele foi possível ao homem descobrir que a fermentação não ocorria por obra divina, e sim por micro-organismos presentes na Microflora do ambiente, isso permitiu a definição de processos e melhores controles sobre a produção. No entanto, ainda demorou quase 200 anos para que as leveduras fossem totalmente desvendadas, e o cientista que fez isso foi o famoso Louis Pasteur. É incomensurável a importância desse cientista, juntamente com Christian Hansen que propagou as cepas de levedura, para a história cervejeira. Pasteur ainda desenvolveu, em 1.886 o método da pasteurização, que permitiu maior longevidade à cerveja.

Podemos dizer que esse foi o ponto aonde nasceu a cerveja que conhecemos hoje. Nos próximos textos, seremos mais específicos sobre cada uma das escolas cervejas e como elas se desenvolveram para oferecer hoje mais de 120 estilos diferentes da bebida.

Aguardem...

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