terça-feira, 17 de setembro de 2013

Escola Cervejeira I - Alemã



No nosso último post, falamos sobre a história da cerveja de uma ótica global, agora aprofundaremos em cada uma das escolas cervejeiras, suas características e como surgiram seus estilos.

Chamamos de Escolas Cervejeiras as regiões e populações onde, no decorrer da história, foram desenvolvidos os estilos de cerveja que hoje conhecemos e são reproduzidos pelo mundo. De forma geral, cada escola cervejeira possui características que confundem com a história particular de sua sociedade, além das características regionais de produção.

As Escolas Cervejeiras, a saber, são: Escola Alemã (Incluí Alemanha, Rep. Tcheca e Áustria), Escola Belga (Inclui Bélgica e França), Escola Britânica (Incluí Inglaterra, Irlanda e Escócia) e Escola Americana (Estados Unidos da América). Nesse artigo, trataremos da Escola Alemã.

Cerveja Alemã Oktoberfest
A Tradicional Oktoberfest. Fonte: http://9dades.com.br

O nascimento da Escola Alemã.

Na região da Baviera, hoje sul da Alemanha, houve cerveja desde sempre. Como citado no post anterior sobre a história da cerveja, até a idade média, fabricar cerveja era uma atividade que cabia às mulheres em suas casas. Os primeiros registros de cerveja em escala industrial apontam para os mosteiros por toda a Europa, e na Alemenha não foi diferente, tanto que a cervejaria mais antiga do mundo em atividade até hoje data de 1.040 e nasceu na extinta Abadia de Weihenstephan, hoje uma Universidade.

A Lei da Pureza da Cerveja Alemã

Mas a história das cervejas alemãs, tal qual conhecemos hoje, começa em 1.516 (primórdios da Idade Moderna) com a promulgação da famigerada Lei da Pureza (Reinheitsgebot, para os íntimos). A Lei foi introduzida pelo Duque Guilherme IV (Wilhelm IV, para os íntimos) da Baviera, e restringia-se apenas a essa região. Poderia escrever um post exclusivo sobre essa Lei, de tão vasto e interessante o assunto, mas não faz sentido falar da Escola Alemã sem citá-la.

A Lei da Pureza Alemã pregava, entre outras coisas, que os únicos ingredientes permitidos na produção da cerveja seriam água, cevada e o lúpulo (a levedura ainda era um elemento desconhecido, e foi inserida na lei posteriormente). A Lei também decorria sobre os impostos cobrados sobre a produção da cerveja, assim como os valores pela qual a mesma deveria ser comercializada.

A Reinheitsgebot vingou por mais de 400 anos, foi sofrendo adaptações (a principal foi a inclusão do trigo como ingrediente) e estendida a todo território Alemão, mas a essência seguiu a mesma. No século XX, o povo alemão teve de abrir mão da Lei da Pureza tal qual ela era, principalmente por questões alfandegárias dentro da Comunidade Europeia. Em 1993 a Lei da Pureza Alemã foi alterada para Lei Provisória da Cerveja Alemã (Vorläufiges Deutsches Biergesetz, para os íntimos), que é mais flexível e permite a inclusão de adjuntos e aditivos para cervejas destinadas a exportação e cervejas de alta fermentação. No entanto, o povo Alemão e os produtores da bebida continuam fieis a antiga tradição de Pureza.

Até aqui, essa história toda não é novidade para um monte de gente, mas vamos apimentar um pouco o assunto... Diversas cervejarias, inclusive as brasileiras, expõe com destaque em seus rótulos e campanhas publicitárias o orgulho de seguir a Lei da Pureza Alemã, como se isso fosse sinônimo de qualidade. Não é, e nem nunca foi.

Dentro de um contexto histórico, a criação da Reinheitsgebot se deu por questões políticas, econômicas e salutares acima da qualidade em si. A primeira razão era inserir imposto sobre a criação e distribuição da bebida. Mas os principais motivos recaem sobre os ingredientes:

Naquela época, a cerveja considerada mais nobre era feita com trigo, e não cevada, no entanto a cevada era muito ruim para a fabricação de pães. Com o trigo sendo usado na fabricação de cervejas, o preço do mesmo era inflacionado e gerava consequente alta no valor dos pães. Assim, determinou-se que a cerveja deveria ser feita exclusivamente com cevada, o trigo deveria ser reservado à fabricação de pães e a aveia à ração para animais. Mas nosso amigo Duque da Baviera de bobo não tinha nada, além dele mesmo deter a maior parte da produção de cevada, a cerveja de trigo, por ser considerada nobre, ainda podia ser fabricada por cervejarias com autorização especial, ou seja, as que serviam a aristocracia.

Já o lúpulo, como comentamos em outros posts, foi adicionado à cerveja devido às suas propriedades bactericidas, que ajudava preservar a mesma. Nessa época o lúpulo já era bastante difundido pela Baviera, mas nem sempre era usado, sendo algumas vezes preterido pelo gruit (infusão de ervas). O problema de usar o Gruit eram dois: primeiro a cerveja poderia estragar logo e, segundo, sem controlar os elementos dentro da cerveja alguns cervejeiros por vez adicionavam substancias que não faziam bem a saúde. Tendo essas questões em vista, determina-se que apenas o lúpulo poderia ser usado.

As Lagers Alemãs

Como a levedura ainda era desconhecida, os cervejeiros apenas sabiam que a espuma formada durante a fermentação que flutuava sobre a cerveja poderia ser escumada para outro tanque a fim de iniciar nova fermentação. Mas ainda acreditavam que esse era um processo divino. Essa levedura era geralmente do tipo Ale e fermentava a temperaturas acima de 17ºC.

Foi em 1553 que essa história começou a mudar, e meio que por acaso. O Duque Albrecht V da Baviera estava preocupado com a qualidade das cervejas produzidas no verão e que tendiam a estragar rapidamente, assim, promulgou uma lei que limitava a produção de cerveja aos meses frios e deveriam ser armazenadas se quisessem servir cervejas no verão. Obviamente que a produção das nobres cervejas de trigo para a aristocracia estava liberada.

Pois então as cervejas passaram a ser armazenadas às encostas dos Alpes ou em enormes adegas subterrâneas para que as baixas temperaturas pudessem preservar o liquido até o verão. A grande surpresa é que a “espuma divida” (nossa ainda desconhecida levedura) agia de forma diferente no frio, ao invés de flutuar sobre o mosto da cerveja, ela decantava no fundo da mesma e trazia outros benefícios: Primeiro que as bactérias dificilmente sobreviviam a baixas temperaturas, diminuindo assim as chances de contaminação da cerveja. Além disso, o perfil sensorial das leveduras que fermentam a frio tende a ser mais discretos que nas fermentações mornas. Tudo isso permitia que o cervejeiro mantivesse os padrões das levas sem surpresas.

Outra característica era o tempo de fermentação mais longo do que as cervejas que fermentavam a temperaturas mais altas. Isso exigia que as cervejas ficassem longos tempos armazenados em adegas, e é desse “armazenamento” (Lagerung, em alemão) que surgiu o termo Lager para as cervejas de baixa fermentação.

A Lei caiu em 1850, mas aí já estava estabelecida uma nova forma de fazer cerveja na Baviera.

As Cervejas Ales Alemãs.

Os alemães são, sem dúvida, famosos por suas Lagers, mas algumas Ales merecem destaque nesse cenário: A começar pelas Weizen’s (Cervejas de trigo) que eram consideradas nobres e podiam ser fabricadas pelos aristocratas, são comumente encontradas e reproduzidas no Brasil, além da porta de entrada para muitas pessoas no mundo mais amplo da cerveja.

Outras duas cervejas Ales alemãs de muito destaque são originários da Colônia e de Dusseldorf, respectivamente Kölsch e Altbier. Ambas cidades preferiram manter suas tradições quando surgiu a febre pelas cervejas de Levedura Lager, em especial a Pilsen. Mas as semelhanças param por aí, as cidades nutrem uma enorme rivalidade histórica (desde que Dusseldorf fazia parte da Colônia) como podem ver na imagem abaixo.
Cervejas Ales Alemãs
Fonte: http://cervejariabamberg.blogspot.com.br
As cervejas também possuem perfis sensoriais totalmente opostos, mas trataremos deles e de diversos outros estilos Alemães em um próximo post, com analise sensorial e dicas de harmonização.

Ein Prosit!!!

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